Manejar bem os pastos é sempre um grande desafio, pois envolve um grande dilema da natureza: fazer as plantas produzirem folhas para crescerem vigorosas e, ao mesmo tempo, fornecerem folhas em quantidade e qualidade para que os animas se alimentem bem e convertam em mais carne, leite, lã e etc. Conhecer esse dilema e manejar bem os pastos, é fundamental que você domine dois processos: entender como as plantas crescem e quais são as estratégias dos animais para cumprir o seu desafio diário, que é chegar no final do dia de barriga cheia.

 

As plantas para crescerem precisam de folhas, que funcionam como grandes placas solares. Captam a radiação e, somadas a água, nutrientes do solo e o gás carbônico da atmosfera, fazem a fotossíntese e geram energia para produzir. Os herbívoros (bois, ovelhas, cabras e cavalos) no seu processo de pastejo, consomem preferencialmente folhas, já que nelas concentra a maior quantidade de nutrientes, extremamente importante para a nutrição e desempenho desses animais. Se vocês não tinham notado isso, agora, acredito que tenha ficado mais claro onde mora todo o desafio.

 

Como essa história é um pouco longa, resolvi dividir em três partes (quase uma trilogia do cinema). No texto de hoje, vamos falar do crescimento das plantas gramíneas. No próximo, como os herbívoros se alimentam e, por fim, como gerenciar esse dilema e manejar bem os pastos. Em todos eles vamos procurar explicar de maneira bem simples, sem muito “tecniquês”, para que um maior número de pessoas entendam toda essa lógica dos processos e possam aplicar isso no seu trabalho diário, buscando zerar os erros no manejo dos pastos.

 

Então, vamos começar!

 

Perfilhos, os nossos soldados do crescimento do pasto

Antes de falar especificamente do crescimento do pasto de verdade, é preciso falar um pouco do que é formado o chamado perfilho. O perfilho, se a gente fosse comparar com um exército, ele é o equivalente ao soldado. Uma pastagem é composta por uma série de “soldados”: o exército de perfilhos. Cada soldado é uma plantinha nova que aparece e pode sair da base (a partir do solo) ou aéreos, quando saem a partir da inserção das folhas nos colmos. Como no exército cada soldado é importante, o crescimento de cada perfilho é fundamental para o crescimento e produção da pastagem como um todo.

 

O nosso soldado vegetal, o perfilho, é formado pelas raízes, colmos (muita gente chama de talos), folhas e o material morto. O material morto ou senescente é basicamente as folhas secas que vão aparecendo na parte de baixo dos perfilhos. A medida que o pasto cresce essas folhas ficam sombreadas, não conseguem mais fazer fotossíntese, perdem a função e sem forças acabam morrendo. Quanto mais alto os pastos, mais folhas. Até mesmo perfilhos inteiros acabam sendo sombreados na base do dossel (amontoado de perfilhos, colmos e folhas), deixam de produzir e acabam morrendo (a competição por luz é ferrenha).

 

Figura 1. O nosso soldado, o perfilho, na esquerda e o dossel (emaranhado de perfilhos) na direita.

 

Toda produção das raízes, folhas e colmos partem de um ponto de crescimento dos perfilhos, o chamado “meristema apical” (sei que esse nome é difícil, mas não se assuste). Quando os perfilhos são pequenos, o meristema apical está bem rente ao solo e protegido de ser comido pelo gado – “soldado novo, ainda bem ressabiado”. Se o meristema for comido, significa que o soldado foi abatido e aquele perfilho já era. Não tem mais da onde surgir novas folhas e morre, por isso é importante protegê-lo. Conforme a situação vai ficando tranquila, sem muito combate, os perfilhos (nosso soldados) vão crescendo, os colmos vão alongando, o meristema apical vai ficando mais corajoso, assume o risco e perde o medo, sobe por dentro do colmo e se não for comido no meio do caminho sai lá em cima, no formato de inflorescência (estrutura que sustenta as flores) e depois produz as sementes, cumprindo a sua missão.

 

Já entendeu né, uma vez que a inflorescência aparece, aquele perfilho não emite mais folhas e para de crescer. Nosso trabalho enquanto manejadores de pasto é prorrogar ao máximo que a missão dos perfilhos, de produzir sementes, seja cumprida.

 

Evolução da tropa: a curva de crescimento do pasto

Bom, agora que você já entendeu do que são formados e como é a dinâmica do crescimento de cada soldado, os perfilhos, vamos falar um pouco da evolução do crescimento de toda a tropa, a chamada “curva de crescimento do pasto”. Para fica mais fácil de explicar toda essa caminhada, vamos imaginar que gente tem uma área de um pasto já bem adubado e em uma certa noite um lote grande de gado escapou, entrou nesse piquete e pela manhã, quando você foi olhar, a área e o pasto estava no chão, totalmente rapado. Você rapidamente abre a porteira e tira os animais da área, deixa esse piquete fechado e reforça a cerca para não ter mais essa surpresa desagradável.

 

Agora, me acompanha e tenta imaginar esse pasto crescendo ao longo dos dias, certo? A figura logo abaixo vai ilustrar a curva de crescimento e vai nos ajudar a entender melhor todo esse processo.

 

 

Figura 2. A curva de crescimento do pasto.

 

Na curva, a fase inicial do pasto chamada de “rapador” o pasto ainda é bem baixo, praticamente os perfilhos são formados de folhas, porém folhas bem pequenas. Por isso, tem uma baixa capacidade de captar luz e produzir energia, assim o seu crescimento é bem lento. A medida que os soldados (perfilhos) vão crescendo eles alcançam a fase exponencial. Esse é considerado o período de máximo crescimento do pasto, onde as plantas atingem uma altura média, temos uma área considerável de folhas com alta taxa fotossintética e o pasto explode em crescimento. Chamamos de fase do “pulo do pasto” e vem com aquela frase que a gente sempre ouve: “meu pasto semana passada parecia que não saía do chão e em poucos dias deu um pulo”. Nessa fase, além das folhas maiores, temos um pouco mais de colmos, mas ainda controlado. Algumas folhas e perfilhos mais fracos e menores começam a serem sombreados e morrer.

 

Depois vem a terceira e última fase, a chamada “tá sobrando pasto”. Para quem acha que essa é uma fase boa, sinto em informar que não é e já explico. Nessa fase o pasto já está bem alto e para dar sustentação para todo este ganho em altura, os perfilhos tiveram que aumentar muito a quantidade e a massa dos colmos. O mesmo processo acontece com as folhas, que agora estão bem grandes (captam bastante luz), mas ficam bem mais duras para segurar todo esse tamanho. O número de perfilhos também já é bem menor, boa parte dos nossos soldados acabaram sombreados e morreram junto com boa parte das folhas da parte de baixo do dossel.

 

Já deu para perceber que toda essa estrutura grosseira do pasto e toda a mortalidade de folhas e perfilhos não é desejável. O pasto segue crescendo, mas boa parte do que se produz de folhas acima, aumentam as perdas logo abaixo, pois mais folhas e perfilhos vão sendo sombreadas. Por fim, nessa fase os soldados cumprem mais fácil a sua missão de emitir inflorescência e depois sementes.

 

Nem baixo demais, nem alto demais

Todo esse processo de crescimento do pasto no piquete imaginário que ficou sem gado e foi da fase “rapador” até a fase “tá sobrando pasto” (Figura 3), acontece em boas condições de temperatura e chuvas, em aproximadamente 45 dias nos pastos tropicais e 60 dias nos pastos de inverno, tempo relativamente curto entre a falta e sobra excessiva.

 

Figura 3. Nem baixo demais (esquerda), nem alto demais (direita)

 

Nossa meta, enquanto manejadores de pasto é ajustar a carga animal para controlar o crescimento dos perfilhos e manter os pastos sempre na fase do “pulo”, onde o crescimento é máximo, com muitas folhas tenras e as perdas, com o aparecimento de folhas mortas e presença de colmos, pequenas. Para que isso aconteça, além de dominarmos o crescimento do pasto e o porquê não podemos perder a mão (não deixar baixo demais ou alto demais), temos que entender como os animais se alimentam. Mas, esse é um tema que vamos falar no próximo texto. Até lá!

 

Texto: Armindo Barth Neto

Consultor e Coordenador de Negócios e Relacionamento – SIA

Imagens: Banco de imagens SIA