Chegamos ao último texto da nossa trilogia sobre o manejo do pasto. Se você já leu os outros dois textos, já sabe que colher bem um pasto tem uma força econômica incrível. É a fonte de alimento mais barata e que tende a deixar mais margem (dinheiro) ao negócio agropecuário. Também entendeu como as plantas forrageiras crescem e quais as estratégias dos animais quando eles estão frente a frente com uma pastagem. Neste último texto, vamos juntar tudo isso e falar de maneira muito simples e fácil como aplicar na prática a arte de manejar pastagens.

Isso mesmo, você vai ver que manejar pasto é uma arte, que envolve e, logicamente, contém muita técnica (entendimento dos processos), sensibilidade, dedicação, disciplina e criatividade.

 

Pastor, pegue o seu cajado!

Manejar bem as pastagens logicamente que não é uma busca recente, ela vem de milhares de anos e é bem representada na profissão do pastor, uma das profissões mais antigas do mundo, que existente até hoje em alguns lugares do mundo. O pastor é aquele cara que todos os dias bem cedinho pega o seu cajado, seu rebanho e conduz para o campo ou montanhas para os animais pastarem. A profissão de pastor, sempre exigiu muita observação, “tomar nota” do que os animais mais gostam e oferecer o melhor para eles, administrando para que não passem do ponto, e comprometam a quantidade de pasto disponível para os próximos dias e meses. Controlam assim a intensidade com que os animais “atacam” as folhas das plantas e a frequência com que eles retornam para aquele mesmo lugar. Esse é o “cerne” do manejo de pasto, que atualmente nas propriedades, utilizamos as cercas para guiar e oferecer aos animais o que há de melhor para eles. Aliás, nunca esqueça disso!!!

 

A grande estrela do manejo: o Pastoreio Rotatínuo.

Como você pode notar no segundo texto desta trilogia, o quanto os animais comem por dia é influenciado fortemente pela estrutura do pasto que eles encontram ao longo desta jornada. Além disso, existe uma estrutura ótima ou uma altura ótima do pasto em que os animais conseguem comer mais em menos tempo. Esta á a base da filosofia de manejo do Pastoreio Rotatínuo, que foi desenvolvida pelo GPEP (Grupo de Pesquisa em Ecologia do Pastejo da UFRGS) e aplicada a campo em todas as propriedades atendidas pela SIA.

 

As pesquisas mostraram que além de existir esta altura ótima, em que comem mais em menos tempo, durante o rebaixamento do pasto, em que os animais vão comendo e a altura vai baixando, existe uma altura limite, que depois deste ponto a taxa de ingestão cai drasticamente. Este ponto é o mesmo para espécies perenes ou anuais, de clima tropical ou temperado. Não se deve rebaixar mais do que 40% da altura ideal de entrada, depois deste ponto, fica muito difícil os animais encontrarem as alturas ótimas no piquete, acabam acessando as camadas mais de baixo do pasto, com poucas folhas, mais talos e colmos e a sua taxa de ingestão cai muito. A figura abaixo apresenta as alturas de manejo do Pastoreio Rotatínuo.

 

Alturas de pré e pós pastejo do Pastoreio Rotatínuo.

 

Para entender melhor esta filosofia de manejo, imagine na seguinte situação (preciso da sua criatividade agora): uma vaquinha holandesa, bem malhada, sentada em uma cadeira segurando uma colher na sua pata. Esta vaquinha adora comer iogurte e a sua meta é fazê-la comer o máximo de iogurte possível ao longo do dia, certo? Para isso, a gente posicionou ao lado dela uma mesa, e em cima desta mesa um monte de pequenos potes de iogurte, todos eles já destampados e só precisamos alcançar para a vaca o maior número possível de potes de iogurte para que ela encha a barriga rápido. Logo que você alcança para ela os primeiros potes, você observa que no início as colheradas são cheias, bem generosas. A medida que ela vai dando as colheradas e passando dos 40% do pote, as colheradas começam a ficar mais vazias, com menos iogurte, perdendo eficiência no processo e até chegar no final do pote, as colheradas vão ficando cada vez mais vazias. Como podemos mudar isso? Simples! Toda vez que a vaquinha chega nos 40% do pote, antes que as colheradas comecem a ficar mais vazias, você alcança um novo pote para ela e rapidinho ela enche a barriga.

 

Esta é a grande lógica do rotatínuo, toda vez que o pasto chega perto de perder eficiência no processo de colheita por parte do animal, oferecemos um piquete pote novo, ops, um piquete novo. Aí você deve estar pensando, mas assim a gente deve estar desperdiçando muito iogurte? Aí que você se engana, diferente do iogurte, o que sobra no piquete quando tiramos os animais, são plantas com muitas folhas, com alta capacidade de captar a radiação, as plantas seguem crescendo e em poucos dias este piquete estará pronto de novo para ser pastejado. Uma grande coincidência da natureza, a altura que é ótima para o animal, também é ótima para a planta continuar crescendo e isso resulta em mais carne, leite e lã por animal, já que eles podem escolher o melhor e por área, pois as plantas não param de crescer, o que resulta em uma maior capacidade de suporte (mais animais/hectare).

 

(Foto na Faz. Horizonte, em Diamante do Sul Paraná, 02/06/2020).

Pastos de aveia em pastoreio Rotatínuo um dia depois da saída dos animais do piquete, com 18cm de altura. Note a quantidade de folhas no pasto, boa parte delas nem foi tocada pelos animais. Carga média de 3UA/ha e o retorno dos animais no mesmo piquete em 8 dias.

O Rotatínuo na prática!

Talvez você deva estar pensando: meio complicado esse manejo do Pastoreio Rotatínuo, dificilmente vai dar certo aqui em casa. Para fechar a Trilogia, vou te dar 10 dicas, que vão facilitar bastante o seu trabalho, te ajudar a não errar mais e dominar a arte de maneja dos pastos:

1)Maneje os pastos dentro da altura ótima de manejo: nunca passando para cima ou para baixo das alturas limites (ver gráfico das alturas), mantenha o manejo dentro da faixa ótima e você estará maximizando a taxa de ingestão dos animais;

2) Faça poucos piquetes, e acelere o giro: como o Rotatínuo mantém muitas folhas no pasto, isso resulta em um rápido crescimento e o grande número de piquetes pode fazer o pasto chegar antes do esperado, podendo passar da altura de entrada. Pastos tropicais não passe de 4 piquetes, já pastos temperados, esse número deve ser inferior a 12 piquetes;

3) Entre antes da altura de entrada: quando começar o manejo em um pasto novo, coloque os animais um pouco antes da altura limite de entrada, assim, quando chegar no último piquete ele ainda vai estar dentro da meta de manejo. Entrando bem no limite, os demais piquetes seguem crescendo e ao chegar no último piquete, certamente ele vai ter passado do ponto;

4) Nunca rape os pastos: haja o que “hajar” nunca rebaixe além da altura de saída, mesmo no caso de ter uma forte seca, faça um pastejo horário (área de escape), entre com suplementação, mas não rape, assim você não obriga os animais a comerem colmos e preserva as folhas do pasto, logo que voltar a chover o pasto vai estar apto para crescer.

5) Treine o seu olho: no início leve uma trena para medir a altura do pasto, aos poucos você ou seu colaborador, vão ficando com os olhas calibrados de quando a altura está ótima ou não para entrada e saída dos animais;

6) Um olho no pasto e o outro no gado: grande parte da equipe de colaboradores está muito treinada para olhar os animais (doente, machucado e etc), mas não tem o habito de olhar o pasto, não tem como manejar bem um pasto sem cultivar este habito;

7) Ajuste a carga certa: Tenha sensibilidade na hora de iniciar o manejo dos pastos, inicie com uma carga um pouco abaixo do ideal, e vá aumentando aos poucos, isso ajuda a não errar a mão logo de “cara”. Em investimento moderado e adubação, pastos tropicais suportam de 3 a 4 UA/ha, já pastos de inverno de 1 a 2 UA/ha (UA – Unidade animal de 450kg de PV);

8) Na dúvida troque de piquete: se no final do dia você for olhar um piquete e ficar na dúvida que se deixar os animais nele pode ser que no outro dia pela manhã o pasto pode estar abaixo da altura de saída, troque de piquete, melhor tirar antes do que rebaixar demais;

9) O que vale é a altura média: é normal encontrarmos locais no piquete com pastos um pouco mais altos ou um pouco mais baixo das alturas limites de entrada e saída, não se preocupe, o que conta mesmo é a altura média do piquete;

10) Tanto faz contínuo ou rotativo: o Rotatínuo é uma filosofia de manejo e não um método, mantendo dentro das alturas ótimas os animais irão maximizar a taxa de ingestão, use o método que achar melhor, contínuo ou rotativo e seja feliz :D.

 

Texto: Armindo Barth Neto – Consultor técnico SIA

Imagens: Arquivo SIA