A onda de coachs invadiu o Brasil nos últimos anos e vem influenciando muito o comportamento das pessoas ao redor do país. A palavra “coach” vem da língua inglesa e significa “treinador”. Como toda grande onda, temos várias coisas boas e coisa ruins quando isso acontece. As ruins você sabe muito bem e vem acontecendo por aí, muitos charlatões sem conhecimento apareceram e produziram além de vídeos cômicos e quase que inacreditáveis, comportamentos sem muito sentido, que se perdem com o tempo como fogo de palha. Por outro lado, tem muita gente boa nesta área, com muito conhecimento, colocando luz em como perdemos tempo fazendo coisas que tem pouca importância e ajudando muita gente a colocar foco e tempo no que realmente devemos nos importar.

 

Nós mesmos da SIA montamos o Farm Coaching, um treinamento muito bom que leva o conhecimento técnico de maneira muito simples e didática, junto com o desenvolvimento pessoal. Já organizamos 4 edições do Farm Coaching (3 no RS e 1 no PR), e os resultados e as mudanças das pessoas após o treinamento são realmente fantásticos. Olhando para esse lado positivo e transformador, parei um dia para pensar: – será que os animais não precisam também de uma dose de “coach” na vida deles??? Antes de você achar que eu estou ficando louco ou já imaginar um palestrante para uma turma de vacas ensinando técnicas de PNL (Programação Neurolinguística), calma! Não é nada disso. O que eu falo é que nós devemos conduzir os animais a focarem no que realmente importa para o desempenho deles, agora faz sentido?

 

Um grande exemplo para esta minha lógica de raciocínio está ligado aos sistemas de produção de leite e as vacas leiteiras. Vacas leiteiras são extremamente eficientes em produzir alimento em leite. Para que isso aconteça, uma vaca holandesa quando levanta todos os dias pela manhã tem um desafio enorme que é comer aproximadamente 19 kg de Matéria Seca (alimento descontado o teor de água), ou seja, o foco dela tem que estar em cumprir esse desafio diário. (A figura abaixo ilustra este desafio).

 

 

Foto: Prof. Malcolm Gigg

Fig. 1 – Ilustração da quantidade de matéria seca que uma vaca leiteira precisa comer diariamente.

 

Grande parte das vezes que uma vaca não atinge a produção esperada, se atribui a ela não conseguir cumprir esse desafio diário e uma das grandes limitações para isso é o TEMPO. As vacas não tem tempo para comer esse monte de comida ao longo do dia. Das 24h, 10 a 12h são de escuro e ruminantes comem praticamente quase nada a noite (somente 3% na média), aí já ficamos com somente metade das horas disponíveis. Desse restante, temos a ordenha diária (duas vezes ao dia).

 

Todo o processo de buscar as vacas, sala de espera e ordenha e volta para a alimentação, na média, dura quatro horas nessa função (duas horas de manhã e duas horas a tarde). Nos restam então somente oito horas do dia para as vacas comerem. Sendo que, elas precisam em média de três refeições para consumir toda a comida, já que elas não conseguem comer tudo de uma só vez. Nós, como bons coachs, (treinadores), devemos montar uma estratégia e tática perfeita de Gestão do Tempo para que no final do dia a meta seja batida.

 

Em sistemas confinados bater a meta não é muito fácil, quando falamos de sistemas a pasto, o desafio é ainda maior, já que as vacas precisam sair para pastar e procurar o seu alimento. Como organizar a gestão do tempo das vacas leiteira com base na alimentação a pasto? Você já deve estar pensando, “é impossível e não tem como as vacas serem bem produtivas a pasto”.  Sinto lhe dizer, mas você está errado!

 

Aqui vão duas dicas infalíveis de gestão do tempo para vacas leiteiras a pasto, que nós técnicos da SIA utilizamos e funciona muito bem para que as vacas a pasto batam sua meta diária.

 

Dica 1: os pastos oferecidos para as vacas leiteiras têm que ser manejados seguindo as alturas do Pastoreio Rotatínuo, para que quando a vaca baixe a cabeça no pasto ela possa comer mais em menos tempo, tendo tempo inclusive para exercer o seu poder de seleção e escolher o que tem de mais nutritivo e melhor na pastagem para ela.

 

Dica 2: Vacas preferem pastar nas horas mais frescas do dia, no início da manhã e no final da tarde. Ao menos de uma a uma hora e meia nesses períodos do dia elas devem estar no pasto.

 

Na prática, as duas dicas acima raramente são vistas a campo, o mais comum, falando do manejo dos pastos, é encontrarmos pastos passados demais ou rapados demais, e isso dificulta muito para as vacas ingerirem pastos em quantidade. Quando passa do ponto os pastos são grosseiros, as vacas perdem tempo para colocar toda a massa de pasto para dentro da boca e ainda é um material de baixa qualidade. Quando estão muito rapados, os pastos até têm qualidade, mais os bocados são muito pequenos e encher a barriga com uma colherinha de “café” no tempo certo é impossível.

 

Quando falamos de pastar nas horas mais frescas, geralmente onde estão as vacas neste momento na esmagadora maioria das propriedades? Na ordenha é claro! O somatório das duas ações resulta em baixo interesse das vacas em pastar, já que após a ordenha, as vacas vão para o pasto nas horas mais quentes (um calorão infernal) ou quando já está escuro, de barriga cheia de silagem e ração, para comer um pasto passado do ponto.

 

Para mudar estar história, como bons gestores de tempo para as vacas, precisamos preparar um bom pasto, com uma boa proporção de folhas verdes, realmente atrativos, depois manejá-los seguindo as alturas do Pastoreio Rotatínuo, para que possam comer mais em menos tempo, encher a barriga rápido, com tempo suficiente para escolher o que tem de melhor disponível para elas (quantidade + qualidade). Além disso, para elas pastarem com vontade, precisamos que elas estejam nos pastos logo que o dia amanhecer, pousem em um bom piquete, que permitam que elas pastem logo cedinho ao menos uns 40 minutos a uma hora, quando começa a clarear o dia, por isso comece a ordenhar um pouco mais tarde, por volta das 7h – 7h30.

 

Esse horário exato varia um pouco de acordo com a região do país que você está, mas garanta o tempo dela no pasto (Obs: não dê bola para os vizinhos, que pode te chamar de preguiçoso por ordenhar as vacas mais tarde, aproveita para tomar um bom café da manhã com a sua família). No final do dia a lógica é a mesma, mas a estratégia é ao contrário, inicie a ordenha mais cedo, para que quando as vacas entrem no pasto e tenham ao menos uma hora e meia de luz e temperatura mais amena para pastar com tranquilidade.

 

Como toda a mudança de rotina em vacas leiteiras, isso dever ser feito com bastante calma e cuidado, para que elas sintam os estímulos, entendam as mudanças que estão acontecendo e o impacto na produção seja o menor possível.

 

Além dessas dicas de Coach, quais outras ações podemos colocar em prática para gerir melhor o tempo das vacas e facilitar o trabalho dos animais? Siga a premissa de entender a natureza e favorecer o bem-estar, assim tenho certeza que eles irão te retribuir com muito mais desempenho!!!

 

Texto: Armindo Barth Neto – Consultor técnico SIA

Imagem: Prof. Malcolm Gigg